O Sacrifício
Paul Sedir
São três palestras com objetivo essencialmente didático, sem pretensão literária e, talvez com uma intensão precisa, que o autor não manifestará abertamente até o final da terceira palestra: O Mestre apareceu sem aviso, “como um ladrão”.
Contudo, apesar do delicioso tratamento que Sedir dá ao polêmico tema do Sacrifício, o realmente interessante é o sentido do Sacrifício em si, que o autor sugere, mas não diz abertamente, sentido esse tão esquecido pelo homem moderno.
Atualmente impera a ideia de que um sacrifício é algo doloroso, penoso, onde perdemos algo ou temos que ceder algo, mas não era assim para os antigos, mais perto que nós do sobrenatural, do mágico, para quem o sacrifício era, antes de tudo, um ato de magia.
Sacrificar, do Sacer faceré é um “fazer sagrado”, daquele que até o momento do Sacrifício pertencia ao mundo profano. É endireitar o que está torto ou restituir ao seu estado primordial aquilo que caiu na prisão deste mundo inferior. Para que esta saída se opere é preciso realizar uma limpeza; por esta razão muitos sacrifícios são realizados na fogueira, com um fogo purificador.
Mas, cabe aqui a pergunta: o sacrifício físico é o verdadeiro sacrifício e o fogo da fogueira é o verdadeiro fogo? Ou nos estão falando de outro fogo?
Sacrifícios “aos deuses” para “aplacar sua ira” aparecem em muitas tradições. Este é outro sentido do Sacrifício no qual Sedir não se estende: a pacificação. É o sentido do conselho evangélico que nos exorta a “fazer as pazes com nosso inimigo” (Mateus 5:25). Mas quase sempre queremos encontrar esse inimigo, este adversário, fora de nós, quando na realidade, se temos alguns inimigos fora é precisamente porque temos um Inimigo dentro.
O episódio dos Atos de Tomé denominado “O Hino da Pérola” é bastante conhecido, onde o protagonista, que se instalou acidentalmente no Egito, símbolo deste mundo, esquece suas origens reais, desaparecendo na ignorância de sua Verdadeira Identidade. É necessário que leia a Mensagem que lhe traz um anjo para tomar o caminho de volta a casa.
O que era sagrado foi recoberto pelo profano, perdendo a memória de suas origens. A mensagem veio recordar-lhe o que era, exortando a fazer uma metanóia, dar meia volta, voltar ao seu estado primogênito. Talvez por isso Sedir diga que “o sacrifício é o Verbo”. Porque, no fundo, o protagonista do Canto da Pérola não é senão o Filho do Pai, Cristo em nós, esse pobre do Evangelho que disse: “Tive fome e me destes de comer; tive sede e me destes de beber…” (Mateus 25:35).
Devolver-lhe Sua dignidade e sua glória, esse é o sacrifício.