Noite Escura
Poemas
São João da Cruz
Numa noite escura,
Ansiosa, ardente de amor,
Ó, feliz ventura!
Sai sem ser vista,
Estando minha morada sossegada.
Na escuridão e em segurança,
Pela secreta escada disfarçada,
Ó, feliz ventura!
Na escuridão e às ocultas,
Estando minha morada sossegada.
Na noite ditosa,
Em segredo, ninguém me via,
Não vendo eu outra coisa,
Sem outro guia nem luz
Que aquele que em meu coração brilhava.
Esta me guiava
Mais segura que a do meio dia,
Lá onde me esperava
Quem eu bem sabia,
Em lugar no qual ninguém aparecia.
Ó noite que me guiastes,
Ó noite mais amável que a aurora!
Ó noite que reuniste
O Amado com a amada,
A amada no Amado transformada!
Sobre meu seio florido,
Que para ele só se guardava,
Ficou adormecido,
E eu o acariciava,
E o leque de cedros refrescava.
A brisa suave da ameia,
Quando eu afagava seus cabelos,
Com sua mão serena
E pescoço me tocava,
E meus sentidos todos avivava.
Imóvel, esquecida,
O rosto inclinado para o Amado;
Tudo parou, abandonei-me,
Deixando entre os lírios
Ao olvido minha apreensão.
Referência:
São João da Cruz: Obras Completas. Ed. Vozes. 7ª Edição. São Paulo; 2002.
FIM